ESTADO DE SANTA CATARINA SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA DIRETORIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA GERÊNCIA DE TRIBUTAÇÃO REVOGADA E SUBSTITUÍDA PELA NOTA TÉCNICA 01/2020 – Ato Diat nº 033/2020, art. 2º – Efeitos a partir de 29.09.20. NOTA TÉCNICA N° 16/2017 Incidência do ITCMD na instituição e extinção de usufruto 1. Introdução Discute-se a incidência do imposto de transmissão no caso da instituição e extinção de usufruto sob a égide de leis distintas. É o caso do antigo Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI, instituído pela Lei 3.933, de 26 de dezembro de 1966 e do atual Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD, instituído originalmente pela Lei 7.540/1988 e, mais recentemente, disciplinado pela Lei 13.136/2004. O ITBI foi criado na vigência da Constituição Federal de 1967 e contemplava tanto as transmissões de bens imóveis “inter vivos” como as decorrentes de “causa mortis” e, nos casos de usufruto incidia integralmente por ocasião da sua instituição, conforme previa o inciso III, do artigo 1º. Com a Constituição Federal de 1988, o imposto cindiu-se em dois, ficando a transmissão onerosa na competência tributária dos Municípios e a transmissão não onerosa na competência dos Estados. No que se refere ao usufruto, até a vigência da Lei 7.540/1988, o ITCMD incidia integralmente na sua instituição. Com o advento da Lei 13.136/2004, passou a incidir sobre a metade do valor venal do imóvel na instituição desse direito real e a outra metade na sua extinção. A matéria foi tratada pela Comissão Permanente de Assuntos Tributários (Copat) na resposta à Consulta 60/2008 e, mais recentemente, na resposta à Consulta 83/2012. Porém, apesar do posicionamento pacífico da Copat, tendo em vista a permanência de posições divergentes entre os órgãos regionais, há necessidade de manifestação definitiva da Diat sobre a matéria, inclusive porque a divergência suscita incerteza junto aos oficiais dos cartórios de imóveis que se tornam solidariamente responsáveis pelo recolhimento do imposto nos atos em que intervierem, conforme art. 134, VI, do Código Tributário Nacional. 2. Usufruto como fato gerador do imposto de transmissão O fato gerador do imposto de transmissão, tanto no caso do ITBI como do ITCMD, abrange a transmissão de propriedade e de direitos reais sobre a propriedade. O direito de propriedade compreende os direitos de usar, gozar, dispor e reaver a coisa de quem injustamente a detenha (Código Civil, art. 1.228). No caso de instituição de usufruto, o direito de propriedade se reparte, de modo que passa ao usufrutuário o direito “à posse, uso, administração e percepção dos frutos” (C.C., art. 1.394). O nu-proprietário detém a propriedade, mas despida de seus atributos (nua-propriedade). No momento em que cessar o usufruto, a propriedade reveste-se novamente de seus atributos, voltando a ser plena. No escólio de Marco Aurélio da Silva Viana, temos que o usufruto: Como direito real, assegura ao titular a utilização da coisa alheia diretamente, com oponibilidade erga omnes. Necessariamente o usufrutuário terá a posse da coisa. Como direito temporário, ele, embora possa ser vitalício, não se prolonga além da vida do beneficiário. Extinto o usufruto, recompõe o domínio no seu titular”. É possível a cessão do seu exercício, mas não a do direito, que é intransmissível. Com a morte do usufrutuário cedente dá-se a extinção (VIANA, 2004, p. 616). Mais adiante, prossegue o mesmo autor (p. 671): Quando as qualidades de usufrutuário e nu-proprietário são reunidas na mesma pessoa, têm-se a consolidação e a conseqüente extinção do usufruto. O vocábulo consolidação é empregado no sentido de confusão. Se o usufrutuário adquire a propriedade, ou o nu-proprietário o usufruto, volta ela a ser plena (Idem, p. 671). A doação com reserva de usufruto e a subsequente consolidação da propriedade, devida à morte do instituidor, devem ser consideradas de modo integrado. O doador usufrutuário detém a posse e a administração do bem e o direito de usar o bem e perceber os seus frutos. O donatário nu-proprietário detém apenas a nua-propriedade, ou seja, a propriedade sem qualquer dos seus atributos. Com a extinção do usufruto, esses atributos voltam a integrar a propriedade plena. 3. Tratamento tributário do usufruto Embora a instituição e a extinção do usufruto sejam considerados como fato gerador do imposto de transmissão, tanto na Lei 3.933/1966, como nas Leis 7.540/1988 e 13.136/2004, o tratamento tributário difere de uma para outra lei. 3.1. O usufruto na Lei 3.933/1966 Entre outras hipóteses, o art. 1º, III, da Lei 3.933/1966, previa como fato gerador do ITBI a “instituição de usufruto, convencional ou testamentário sobre bens imóveis e sua extinção, por consolidação, na pessoa do nu-proprietário”. Nos termos do art. 7º, V, a base de cálculo na instituição e na extinção do usufruto era o valor venal do imóvel usufruído. 3.2. O usufruto na Lei 7.540/1988 Conforme art. 2º, II, o ITCMD teria como fato gerador a transmissão “causa mortis” ou a doação, a qualquer título, de direitos reais sobre bens imóveis. Já o art. 8º, I, previa que nu-proprietário estaria isento do pagamento do imposto na extinção do usufruto, quanto fosse o seu instituidor. 3.3. O usufruto na Lei 13.136/2004 O art. 2º, II, da Lei 13.136/2004 prevê a incidência do ITCMD sobre direitos reais sobre bens móveis e imóveis – que é o caso do usufruto. O § 2º do art. 7º dispõe que “na instituição e na extinção de direito real sobre bem móvel ou imóvel, bem como na transmissão da nua propriedade, a base de cálculo do imposto será reduzida para 50% do valor venal do bem”. 4. Distinção entre o ITBI e o ITCMD Qual a distinção entre ITBI e ITCMD? Além dos nomes distintos e de terem sido instituídos por leis diferentes, os dois tributos apresentam as seguintes distinções: (i) o ITBI era um imposto dos Estados; (ii) com a Constituição de 1988 o imposto foi cindido em dois, cabendo aos Estados tributar a transmissão não onerosa, enquanto os Municípios passaram a tributar as transferências onerosas; (iii) enquanto o antigo ITBI incidia apenas sobre a transmissão de bens imóveis, o ITCMD passou a incidir também sobre a transmissão de bens móveis. Mas isso basta para caracterizar impostos completamente distintos ou há alguma superposição entre eles? Dispõe o art. 4º do CTN, “a natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualifica-la (i) a denominação e demais características formais adotadas pela lei; (ii) a destinação legal do produto de sua arrecadação”. Ou seja, não interessa o nomen juris do tributo, mas a materialidade da sua hipótese de incidência. Ora, a instituição de usufruto e sua extinção era fato gerador do ITBI, com é fato gerador do ITCMD, tanto sob a égide da Lei 7.540/1988 como da Lei 13.136/2004. Se o fato gerador é o mesmo, então, nesse aspecto, a natureza jurídica específica de ambos os tributos é a mesma. Podemos dizer que há uma continuidade da imposição tributária ao longo do tempo. Estamos diante de uma mesma exação que adotou diferentes formas ao longo do tempo. 5. Tratamento do ITBI no direito intertemporal A aplicação do direito resulta da interação entre o fato e a norma contida no texto legal. Se o fato é o mesmo – no caso a instituição e extinção do usufruto – não se pode pretender tratar como se fossem fatos diferentes porque a lei é outra. “A norma é produzida, pelo intérprete, não apenas a partir de elementos que se desprendem do texto (mundo do dever ser), mas também a partir de elementos do caso ao qual será ela aplicada, isto é, a partir de elementos da realidade (mundo do ser)” (GRAU, 2002, p. 22). Então há uma historicidade na aplicação do direito. O fato ocorre em determinado momento o que lhe dá certa especificidade. “O texto normativo permanece mudo até que seja interrogado e seja trazido para o momento histórico definido diante do qual revelará todo o seu sentido” (PONTES, 2000, p. 17). Mas, no caso em tela, trata-se da aplicação sobre o mesmo fato, em sua concreção histórica, de diferentes textos normativos. O confronto entre diferentes textos tratando da mesma situação fática pode caracterizar um corte sincrónico ou diacrônico quando, nesse último caso se confrontam textos normativos de diferentes momentos no tempo. O método comparativo, pois, supõe o prévio estabelecimento de uma tipologia: “a comparação não é válida senão entre fatos do mesmo tipo, fatos de análoga estrutura” (PILATI, 2000, p. 23). Então, temos que os mesmos fatos – instituição e extinção do usufruto – vem recebendo diferentes tratamentos pela legislação vigente em diferentes momentos do tempo. Contudo, em qualquer hipótese, a mudança de legislação não poderia resultar em gravame maior que o exigível na vigência de uma ou outra lei. Assim, se a instituição e a extinção do usufruto tivessem se dado na vigência da Lei 3.933/1966 ou da Lei 7.540/88, o tributo seria exigido apenas por ocasião da consolidação da propriedade e seria equivalente à aplicação da alíquota sobre a respectiva base de cálculo (valor venal do bem doado). No caso de ter sido integralmente pago por ocasião da sua instituição, descaberia a exigência do imposto por ocasião da extinção do usufruto, pois os direitos da Fazenda Pública já teriam sido satisfeitos, conforme jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal (Primeira Turma, RE 83.855, DJU 1°/out/1976): USUFRUTO DECORRENTE DE DOAÇÃO A TERCEIRO. COM A MORTE DA DONATARIA, EXTINGUE-SE O USUFRUTO E CONSOLIDA-SE A PROPRIEDADE NA PESSOA DO NU-PROPRIETARIO, NÃO SENDO DEVIDO O IMPOSTO DE TRANSMISSAO CAUSA MORTIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. O aresto colacionado continua aplicável nos termos do direito vigente. Com efeito, a Constituição Federal de 1988, art. 155, I, dá competência aos Estados para instituir imposto sobre transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos. No caso em tela, a legislação estadual considera como fatos distintos a transmissão da propriedade e a instituição do usufruto que é um direito real sobre a propriedade. Com a morte do usufrutuário, nos termos da lei civil, não se dá uma “transmissão do usufruto”, mas a extinção do direito real, recompondo-se a propriedade plena. Ora, o art. 110 do CTN veda alterar o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados para definir ou limitar competências tributárias. A lei nova – Lei 13.136/2004 – exige metade do imposto na instituição do usufruto e metade na sua extinção. Se o contribuinte já recolheu a integralidade da exação, nos termos da lei antiga, o direito da Fazenda já foi satisfeito pelo sujeito passivo, nada mais podendo ser-lhe exigido. Com efeito, na hipótese de tanto a instituição como a extinção do usufruto ocorrer na vigência da Lei 13.136/2004, o imposto seria devido em ambas as ocasiões, calculado sobre base de cálculo reduzida, conforme art. 7°, § 2° (“na instituição e na extinção de direito real sobre bens imóveis, bem como na transmissão da nua-propriedade, a base de cálculo do imposto será reduzida para cinquenta por cento do valor venal do bem”). Porém, se o imposto – não interessa se o nomen juris for ITI, ITBI ou ITCMD – tiver sido pago integralmente no momento da instituição do direito real, não poderia ser-lhe exigido o recolhimento de mais 50%, por ocasião da extinção, pois corresponderia a um gravame tributário maior do que seria suportado na hipótese de tanto a transmissão da nua-propriedade como a sua recomposição ocorrerem na vigência da mesma lei. Tal exigência contrariaria o princípio da isonomia, insculpido no art. 150, II, da Constituição Federal, que proíbe instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente. Com efeito, a diferença de tratamento tributário não decorreria da situação do próprio sujeito passivo, mas apenas da circunstância de a instituição do usufruto (transmissão da nua-propriedade) ter ocorrido na vigência de uma lei e a sua extinção (consolidação da propriedade plena) ter ocorrido na vigência de outra lei. 6. Conclusão À evidência, não se poderia, devido a uma interpretação demasiado literal do texto normativo, exigir do contribuinte 150% do imposto previsto. Em outros termos, se o crédito tributário já estava integralmente satisfeito, nos termos da Lei 3.933/1966 ou da Lei 7.540/1988, sobre o mesmo fato gerador – instituição de usufruto – nada mais seria devido a título de ITBI ou de ITCMD. Conforme boa e velha regra de hermenêutica, casos semelhantes devem receber o mesmo tratamento. Independentemente das diferenças entre o ITBI e o ITCMD, as semelhanças nesse particular são patentes: ambas as leis consideram fato gerador a instituição de usufruto e sua extinção. Em ambos os casos, se a obrigação tributária correspondente houver sido integralmente satisfeita, nos termos da lei então vigente, qualquer outro valor exigido com base na lei nova poderia caracterizar crime de excesso de exação, previsto no § 1º do art. 316 do Código Penal: exigir tributo que sabe ou deveria saber indevido. Bibliografia citada GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. São Paulo: Malheiros, 2002. PILATI, José Isaac. Teoria e Prática do Direito Comparado. Florianópolis: OAB/SC, 2000. PONTES, Helenilson Cunha. O princípio da proporcionalidade e o direito tributário. São Paulo: Dialética, 2000. VIANA, Marco Aurélio da Silva. Comentário ao Novo Código Civil, volume XVI: dos direitos reais, coordenado por Sálvio de Figueiredo Teixeira, Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 616. Getri, em Florianópolis, 31 de julho de 2017 Velocino Pacheco Filho Amery Moisés Nadir Júnior AFRE – mat. 184244-7 Gerente de Tributação
ESTADO DE SANTA CATARINA SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA DIRETORIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA GERÊNCIA DE TRIBUTAÇÃO OBSERVAÇÃO: A presente Nota Técnica é anterior ao REsp 1.320.825 RJ, rel. Min. Gurgel de Faria, julgado pela Primeira Seção do STJ, conforme o rito dos recursos repetitivos, em 10-8-2016, pub. no DJe de 17-8-2016: EMENTA. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. IPVA. DECADÊNCIA. LANÇAMENTO DE OFÍCIO. REGULARIDADE. PRESCRIÇÃO. PARÂMETROS. 1. O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) é lançado de ofício no início de cada exercício (art. 142 do CTN) e constituído definitivamente com a cientificação do contribuinte para o recolhimento da exação, a qual pode ser realizada por qualquer meio idôneo, como o envio de carnê ou a publicação de calendário de pagamento, com instruções para a sua efetivação. 2. Reconhecida a regular constituição do crédito tributário, não há mais que falar em prazo decadencial, mas sim em prescricional, cuja contagem deve se iniciar no dia seguinte à data do vencimento para o pagamento da exação, porquanto antes desse momento o crédito não é exigível do contribuinte. 3. Para o fim preconizado no art. 1.039 do CPC/2015, firma-se a seguinte tese: "A notificação do contribuinte para o recolhimento do IPVA perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário, iniciando-se o prazo prescricional para a execução fiscal no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação." 4. Recurso especial parcialmente provido. Julgamento proferido pelo rito dos recursos repetitivos (art. 1.039 do CPC/2015). O acórdão referido tornou superada a NT 1/2012, no que se refere à caracterização do lançamento do IPVA e à contagem dos prazos de decadência e prescrição. Getri, em Florianópolis, 31 de julho de 2017 Velocino Pacheco Filho Amery Moisés Nadir Júnior AFRE – mat. 184244-7 Gerente de Tributação NOTA TÉCNICA N° 001/2012 IPVA: lançamento de ofício: extinção do crédito tributário pela prescrição do direito subjetivo da Fazenda Pública. 1. Colocação do problema: Recentes decisões judiciais têm declarado a extinção de créditos tributários (IPVA), já em fase de execução fiscal, por considerar prescrito o direito subjetivo da Fazenda Pública. O fundamento de tais decisões, levantado pelos executados em embargos à execução ou em exceção de pré-executividade, é do seguinte teor: “como se trata de IPVA, imposto com lançamento direto e vencimento anual previsto em lei conforme o final da placa do veículo, o termo inicial da prescrição deve corresponder à data deste vencimento em cada exercício”. O argumento invoca como fundamento jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, a Colenda Primeira Turma do STJ, no julgamento do Recurso Especial 1.069.657 PR, em que foi Relator o Min. Benedito Gonçalves (DJe 30/3/2009), decidiu que: “2. Na esteira da jurisprudência dessa Corte, o IPVA é tributo sujeito a lançamento de ofício. E, como tal, o termo a quo para a contagem do prazo prescricional para sua cobrança é a data da notificação para o pagamento. Precedentes”. “3. Na hipótese, o Tribunal a quo assentou que os créditos tributários cuja prescrição se reconheceu foram definitivamente constituídos respectivamente em junho de 1.996 e 1.997, porquanto a lei local prevê épocas diferenciadas para o pagamento do IPVA, conforme final da placa do veículo. Ainda segundo o acórdão recorrido, o veículo (Monza 87) tem placa com final 4 (ACB-5194), de sorte que o vencimento do IPVA dá-se até o final do mês de junho de cada ano, data a partir da qual começa a fluir o prazo prescricional de 5 (cinco) anos para a propositura da ação de cobrança”. Não divergiu desse entendimento a Colenda Segunda Turma (AgRg no AgIn 1.399.575; DJe 4/11/2011): “1. Nos tributos sujeitos a lançamento de ofício, como no caso do IPVA e IPTU, a constituição do crédito tributário perfectibiliza-se com a notificação ao sujeito passivo, iniciando, a partir desta, o termo a quo para a contagem do prazo prescricional quinquenal para a execução fiscal, nos termos do art. 174 do Código Tributário Nacional”. A decisão invocou ainda a aplicação da Súmula 83/STJ: "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida". Ambas as decisões consideram, como marco inicial para a fluência do prazo prescricional, a notificação do lançamento (constituição do crédito tributário) ao sujeito passivo, o que está de acordo com a dicção do art. 174 do CTN: “a ação para cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data de sua constituição definitiva”. No entanto, as decisões do STJ consideram o crédito tributário constituído quando encerrado o prazo para recolhimento do tributo. Em tal hipótese, ocorreria a prescrição do crédito tributário antes que o Fisco tenha podido efetuar o lançamento. Contudo, como será esclarecido mais adiante, na situação fática a que se referem os acórdãos citados, a Fazenda Pública, com efeito, havia intimado os sujeitos passivos ao recolhimento do tributo. Essa circunstância deve ser levada em conta pelo juiz, que não deve aplicar mecanicamente o referido critério a todas as situações, sob pena de causar considerável prejuízo ao Erário, tanto estadual como municipal. 2. Decadência e prescrição e a unidade do sistema jurídico: Paulo de Barros Carvalho considera a unidade do sistema jurídico “o mais transcendental entre os princípios fundamentais do direito” (Paulo de Barros Carvalho, Curso de direito tributário, 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 474): “Com efeito, a ordenação jurídica é una e indecomponível. Seus elementos – as unidades normativas – se acham irremediavelmente entrelaçadas pelos vínculos de hierarquia e pelas relações de coordenação, de tal modo que tentar conhecer regras jurídicas isoladas, como se prescindissem da totalidade do conjunto, seria ignorá-lo, enquanto sistema de proposições prescritivas”. A unidade do sistema jurídico também é enfatizada por Heleno Tôrres (Direito Tributário e Direito Privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 39): “O direito positivo é parte de um sistema social, e dentro do sistema social global cumpre uma função específica: a normatividade dessa estrutura, enquanto produto objetivo da cultura humana e fixado numa estrutura linguística. Por isso, o direito positivo é sistema, porque não se trata de mero agregado de proposições normativas, simples justaposição de preceitos, caótico feixe de textos prescritivos. A homogeneidade estrutural do direito deve ser reconhecida na forma de um sistema de proposições prescritivas válidas, determinando-se por uma unidade e unicidade própria”. A essa altura, cabe perguntar: os institutos da decadência e da prescrição no direito tributário têm o mesmo significado de decadência e prescrição no direito privado? ou se trata de institutos distintos? Se forem institutos distintos, não caberia aplicação ao direito tributário de regras do Código Civil relativas a contagem de prazos? Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1.002.932 SP (2009), tratando do prazo para pleitear repetição do indébito, decidiu que antes da entrada em vigor da Lei Complementar 118/2005 o prazo do art. 168 do CTN seria contado da homologação tácita do procedimento do sujeito passivo, condicionado, contudo, à regra do art. 2.028 do novo Código Civil: “serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”. A aplicação de regras do direito civil à decadência e prescrição tributárias faz supor que têm o mesmo conteúdo no direito tributário e no direito privado. Por outro lado, no caso de se tratar do mesmo instituto, o prazo para proceder ao lançamento do tributo será de decadência se e somente se o lançamento for um direito potestativo da Fazenda Pública. Ora, o lançamento não é um direito potestativo, já que a Fazenda Pública não pode dele dispor. Não há opção entre lançar e não lançar. Pelo contrário, a teor do disposto no parágrafo único do art. 142 do CTN, “a atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional”. No magistério de Hugo de Brito Machado (Mandado de Segurança em Matéria Tributária, 5ª ed. São Paulo: Dialética, 2003, pg. 233.), “tendo conhecimento de um fato tributável, a autoridade administrativa não pode deixar de fazer o lançamento correspondente. Assim, editada uma lei criando ou aumentando tributo, desde que ocorrida a situação de fato sobre a qual incide, gerando a possibilidade de sua cobrança, desde logo a autoridade está obrigada a exigir o tributo, e a impor penalidades aos inadimplentes”. Enfim, arremata Paulo de Barros Carvalho (Curso de Direito Tributário. 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 537): “O ato jurídico de lançamento é vinculado e obrigatório, sob pena de responsabilidade funcional (CTN, art. 142, parágrafo único). Trata-se, na verdade, de um dever do Estado, enquanto entidade tributante, que não se confunde com o direito subjetivo de exigir a prestação, não podendo ser considerado, também, como pretende importante segmento doutrinário, um direito potestativo”. 3. Decadência e prescrição no direito privado: Leciona Humberto Theodoro Júnior (Comentários ao Novo Código Civil Sálvio de Figueiredo (coord.), Rio de Janeiro: Forense, 2005) que o Código Civil de 1916 não fazia muita distinção entre decadência e prescrição: “a total ausência de referência no Código antigo ao fenômeno da decadência fez com que a doutrina não tivesse parâmetro algum no direito positivo para construir a teoria delimitadora em relação à prescrição”. Essa deficiência foi suprida pelo novo Código que define a prescrição como perda da “pretensão” a um direito subjetivo amparado pela ação: “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206” (CC, art. 189). Já o prazo de decadência refere-se aos direitos desprovidos de pretensão ou direitos potestativos. Entende-se por direito potestativo (ou direito formativo ou facultativo) a faculdade do sujeito de direito de provocar a alteração de uma situação jurídica que pode ser exercida judicialmente ou extra-judicialmente. O prazo decadencial faz parte do próprio efeito potestativo – nasce junto com ele como um de seus elementos formativos. No escólio de Humberto Theodoro Júnior (Idem, pg. 355): “Embora sejam múltiplos e meio confusos os fundamentos da prescrição, no caso da decadência tudo se explica com um único argumento: é a necessidade de certeza jurídica que determina a subordinação de certos direitos facultativos ao exercício obrigatório dentro de determinado prazo, para que, a seu término, se tenha como firme e inalteravelmente definida a situação jurídica das partes. É de interesse público que as situações jurídicas submetidas a esse tipo de prazo fiquem definidas de uma vez para sempre, com o seu transcurso”. Estariam, assim, submetidos a prazos de decadência, o direito de o doador revogar a doação, no caso de ingratidão do donatário ou o exercício do direito de compra pelo condômino. Os direitos potestativos são exercidos pelo seu titular, sem que o sujeito passivo possa se opor. Por outro lado, o titular pode escolher não exercer o direito: o doador pode perdoar a ingratidão do donatário ou o condômino não exercer o seu direito de compra. Por isso que os direitos potestativos não são providos de pretensão. A seu turno, Marçal Justem Filho (Curso de Direito Administrativo. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, pg. 976) leciona que “a prescrição envolve o direito de exigir a tutela juriscidional” e que o “prazo prescricional se inicia na data em que uma pretensão for resistida ou não-satisfeita (princípio da actio nata)”. Nessa perspectiva, seria o simples não-pagamento do tributo na data de vencimento – mero cumprimento de dever legal – constituiria “resistência à pretensão”, dando início à contagem do prazo prescricional? Mesmo que a exigência não tenha sido formalizada pelas autoridades fazendárias? 4. Decadência e prescrição no direito tributário: Contudo, apesar do propalado ideal da unidade do sistema jurídico, decadência e prescrição no direito tributário não tem a mesma significação que no direito privado. É o que comenta Eurico Marcos Diniz de Santi (Decadência e Prescrição no Direito Tributário. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 146): “a decadência e a prescrição do direito do Fisco não comportam a mesma amplitude de dissenção nem a mesma complexidade que verificamos no direito privado”. De fato, dispõe o art. 173 do CTN que “o direito da Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos contados (i) do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; ou (ii) da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado”. Porém, no caso de lançamento por homologação, “que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa”, conta-se o prazo da ocorrência do fato gerador (art. 150, § 4°), ao final do qual, “sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito tributário, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação”. Já a ação para cobrança do crédito tributário devidamente constituído, é também de cinco anos, mas contados de sua constituição definitiva. Entende-se como definitivamente constituído o crédito tributário, no caso de impugnação do ato administrativo de lançamento, quando não couber mais recurso em sede de contencioso administrativo tributário. Nesse sentido é a jurisprudência assente do Superior Tribunal de Justiça, como é exemplificativa a decisão da Primeira Turma desse sodalício, no julgamento do REsp 664.349 SP (DJU 1, de 6.9.2007, p. 196; RDDT 146: 238): “2. Enquanto há pendência de recurso administrativo, não correm os prazos prescricional e decadencial. Somente a partir da data em que o contribuinte é notificado do resultado do recurso é que tem início a contagem do prazo de prescrição previsto no art. 174 do CTN. Destarte, não há falar em prescrição intercorrente em sede de processo administrativo fiscal”. Temos assim, que decadência e prescrição sucedem-se no tempo: a decadência, relativamente à constituição do crédito tributário; a prescrição, quanto à correspondente ação de execução. “A decadência opera na fase da constituição administrativa do crédito; a prescrição, no momento do exercício do direito de ação” (Santi, id. p. 217). A referência do legislador à natureza constitutiva do lançamento tem, entretanto, suscitado críticas, por distinguir entre “obrigação” e “crédito” tributários: do ponto de vista da teoria das obrigações, a distinção não procederia, já que o crédito seria a própria obrigação, vista como o direito subjetivo da Fazenda Pública de exigir o cumprimento da prestação. Portanto, ele nasce juntamente com a obrigação e não em momento distinto. Assim sendo, não faria sentido entender o lançamento como constitutivo do crédito tributário. Pelo contrário, seria meramente declaratório da existência do crédito. Desse entendimento, é exemplificativa a posição de Fábio Fanuchi (Curso de Direito Tributário, 4ª ed. Vol. I, São Paulo: IBET; Resenha Tributária, 1986, pg. 263): “... o direito à cobrança de tributos e penalidades nasce, para o sujeito ativo, pela ocorrência da situação descrita em lei como fato gerador da obrigação tributária e não pelo ato que estrutura o crédito que lhe é correspondente. O ato que faz aparecer o crédito é um ato simplesmente declaratório da existência daquele direito”. Entendimento diverso encontramos em Paulo de Barros Carvalho que reconhece o caráter constitutivo do lançamento, mas em outro sentido: apenas com o lançamento, o fato jurídico tributário é introduzido no direito, mediante sua descrição em linguagem competente. Esse autor, em decorrência da aplicação ao estudo do direito da teoria da linguagem, considera que a ocorrência concreta (evento) de situação correspondente à referida no antecedente da norma geral e abstrata somente se torna “fato jurídico”, com a sua descrição, pela autoridade fazendária, passando a ocupar o antecedente de norma individual e concreta. Nessa perspectiva, o conseqüente da norma editada pela autoridade (lançamento) “constitui” um vínculo de cunho obrigacional entre o Estado (sujeito ativo) e o contribuinte (sujeito passivo) que tem por objeto a satisfação da obrigação tributária. Com efeito, leciona o autor referido que “todos os fatos são construções de linguagem, e, como tanto, são representações metafóricas do próprio evento” (Curso de direito tributário, 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 301). Isto porque “o direito é linguagem própria compositiva de uma realidade jurídica” (id. p. 302). “O relato do acontecimento pretérito é exatamente o modo como se constitui o fato, como essa entidade aparece e é recebida no recinto do direito, o que nos autoriza a proclamá-lo como constitutivo do evento que, sem esse relato, quedaria à margem do universo jurídico. Por outros torneios, o enunciado projeta-se para o passado, recolhe o evento e, ao descrevê-lo, constitui-se como fato jurídico tributário” (id. p. 474). Por conseguinte, “a natureza da norma individual e concreta, veiculada pelo ato de lançamento tributário, ou pelo ato produzido pelo sujeito passivo para apurar o seu débito, nos casos estabelecidos em lei, assumirá a feição significativa de providência constitutiva de direitos e deveres subjetivos” (id. p. 476). O lançamento é providência indispensável para que possa ser ajuizada a ação de execução (pretensão impositiva da Fazenda Pública) e, portanto, para que se inicie o prazo prescricional cujo termo inicial é a própria constituição do crédito tributário. Conforme Eurico de Santi (op. cit. p. 218), “na hipótese da regra de prescrição do direito do Fisco, o fator tempo figura em conjunção com a conduta omissiva da Fazenda Pública. E só há omissão, se houver a possibilidade jurídica da exigibilidade do crédito: não basta que o crédito esteja instalado no sistema com notificação regular, líquido e certo, requer-se também que seja exigível. Sem exigibilidade não há omissão, tão somente fluxo de tempo”. Acrescenta Paulo de Barros Carvalho que “instalado o vínculo jurídico tributário e sobrevindo o fato decadencial, a decadência faz desaparecer o direito subjetivo de exigir a prestação tributária e, em contrapartida, também se extingue o débito do sujeito passivo, desintegrando-se o laço obrigacional” (p. 539). Prossegue o mesmo autor: “Com o lançamento eficaz, quer dizer, adequadamente notificado ao sujeito passivo, abre-se à Fazenda Pública o prazo de cinco anos para que ingresse em juízo com a ação de cobrança (ação de execução). Fluindo esse período de tempo sem que o titular do direito subjetivo deduza sua pretensão pelo instrumento processual próprio, dar-se-á o fato jurídico da prescrição. A contagem do prazo tem como ponto de partida a data da constituição definitiva do crédito, expressão que o legislador utiliza para referir-se ao ato de lançamento regularmente comunicado (pela notificação) ao devedor” (p. 540). Temos então que, com a ocorrência do fato gerador, inaugura-se o prazo para a Fazenda Pública constituir o crédito tributário, pela atividade administrativa de lançamento. Esse prazo é considerado de decadência, embora o lançamento não se caracterize como um direito “potestativo” da Fazenda Pública. Constituído o crédito tributário, com a competente notificação ao sujeito passivo, não há mais que se falar em prazo de decadência (ressalvada a hipótese do inciso II do art. 173 do CTN). A notificação dá conhecimento ao sujeito passivo do tributo que lhe é exigido pelo Fisco, o valor da prestação, seus acréscimos (multa, juros e correção monetária), seu fundamento legal e do prazo para sua liquidação. A constituição definitiva do crédito tributário, mediante notificação ao sujeito passivo, ou, no caso de impugnação administrativa, da decisão de que não caiba mais recurso, constitui o termo inicial do prazo para a Fazenda pleitear em juízo a execução do tributo inadimplido. Como visto, os conceitos de decadência e prescrição no direito tributário, além de bem mais simplificados, divergem dos conceitos análogos no direito privado. A decadência está associada ao lançamento (ainda que este não seja um direito potestativo ou formativo da Fazenda), enquanto a prescrição refere-se ao ajuizamento da ação de execução do crédito tributário. Ambas são consideradas causas extintivas da exigibilidade do crédito tributário, a teor do art. 156, V, do CTN. 5. Prazo de decadência ou de prescrição? Informa Brandão Machado (Decadência e Prescrição no Direito Tributário: notas a um acórdão do Supremo Tribunal Federal. In: Direito Tributário Atual, vol. 6, São Paulo: IBDT: Resenha Tributária, 1986, p. 1316) que a eficácia constitutiva do lançamento dominou na doutrina alemã até a promulgação do Código Tributário, quando foi abandonada. Então, por influência de Eno Becker, o direito tributário alemão passou a adotar conceitos de decadência e prescrição mais próximos do direito privado. “Aduzia Becker” diz o citado autor “que o lançamento constituía, na verdade, uma interrupção do prazo de prescrição, uma vez que o lançamento consubstanciava uma cobrança” (p. 1359), pois “o direito de lançar não poderia estar sujeito à decadência. Se o crédito nasce com a ocorrência do fato gerador, e com ele a pretensão, o direito de cobrar deveria coerentemente estar sujeito à prescrição” (p. 1360). Essa construção teórica aproxima os conceitos de decadência e prescrição no direito tributário dos seus equivalentes no direito privado e, por conseguinte, possibilita a realização do tão desejado ideal da unidade do sistema jurídico. Em síntese, com abstração da doutrina majoritária e mesmo da dicção dos arts. 173 e 174 do CTN: se o lançamento e constituição do crédito tributário não é um direito potestativo da Fazenda Pública, então o prazo que flui, tomando como referência a ocorrência do fato gerador do tributo não deveria ser de decadência, mas de prescrição. O lançamento, regulamente notificado ao sujeito passivo, dando conhecimento do tributo exigido, caracterizaria a pretensão impositiva da Fazenda Pública ao crédito tributário e interromperia a fluência do prazo prescricional que recomeçaria, a partir de então, a correr novamente. Então, devemos considerar que “há uma prescrição para a pretensão abstrata, que flui antes do lançamento; e outra prescrição para a pretensão concretizada” (id. p. 1369). Brandão Machado, louvando-se em doutrina de Pontes de Miranda, define pretensão como “a posição subjetiva de poder exigir de outrem alguma prestação” (op. cit. p. 1362). “A pretensão não se confunde com o direito, nem com a ação judicial; é sempre contida no direito, ou se refere a elemento do conteúdo do direito”. Prossegue o mesmo autor, dizendo que: “O que caracteriza a pretensão é a exigibilidade. Exigir a prestação é exercer pretensão. exatamente por isso é que lançar imposto é exercer pretensão, e não exercer um direito formativo, [...] Exigir não é só exigir por meio de ação judicial, pois há pretensões inacionáveis e pretensões ainda não munidas de ação. A exigibilidade pode dar-se através de órgão do Estado, de pessoa a pessoa, ou pelo ato administrativo ou pela ação judicial. Assim como há direitos com ação, mas desprovidos de pretensão, como são os direitos formativos, assim também há pretensões sem ação e pretensões a que não tenha nascido ação. [...] Pode extinguir-se a pretensão, sem que se extinga o direito, como acontece de regra com a prescrição, que extingue não o direito, mas a pretensão” (id. p. 1363). Assim, a pretensão tributária nasceria “no mesmo instante em que surge a obrigação tributária, independentemente da quantificação do crédito, que ocorre por ocasião do seu exercício através do ato administrativo de lançamento” (id. p. 1364). Com efeito, dispõe o Código Tributário Alemão, de 1976 (Novo Código Tributário Alemão, Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: IBDT, 1978), que o momento da ocorrência do fato ao qual a lei vincula o dever da prestação dá nascimento à pretensão tributária (§ 38) e que o prazo para efetivar o lançamento é de prescrição (§ 169). O direito tributário brasileiro, entretanto, não acompanhou essa evolução legislativa e doutrinária, de modo que decadência e prescrição permanecem com sentidos diversos no direito tributário e no direito privado. Por esse motivo não cabe a aplicação de disposições do direito civil sobre decadência e prescrição no direito tributário. 6. Modalidades de lançamento: O CTN prevê três modalidades de lançamento, a saber: (i) direto ou de ofício; (ii) misto ou por declaração; e (iii) autolançamento ou por homologação. No lançamento direto, a autoridade administrativa constitui o crédito tributário mediante atos de ofício, sem participação do contribuinte. Já no lançamento por declaração, a autoridade administrativa efetua o lançamento com base nos dados declarados pelo contribuinte. Por fim, no lançamento por homologação, o contribuinte apura e declara o valor do tributo devido e antecipa o seu pagamento. Nesse último caso, o pagamento antecipado extingue o crédito tributário, sob condição resolutória de ulterior homologação do procedimento pela autoridade administrativa. No caso do lançamento por homologação, considera-se que a declaração do contribuinte, informando a Fazenda do montante do tributo devido constitui o crédito tributário e inaugura a fluência do prazo de prescrição, conforme jurisprudência sedimentada do Superior Tribunal de Justiça: “o instituto do autolançamento do tributo, a revelar, em última análise, a confissão do contribuinte, dispensa a notificação fiscal para ter-se a exigibilidade” (STF, Primeira Turma, AgRg no AgIn 539.891-3; RDDT 148: 188). Desse modo, “conta-se da data da entrega do documento de formalização do crédito tributário pelo próprio contribuinte (DCTF, GIA etc.) o prazo qüinqüenal para o Fisco acioná-lo judicialmente, nos casos dos tributos sujeitos a lançamento por homologação” (STJ, Primeira Turma, EDcl nos EDcl n AgRg no REsp 1.124.339 PA; RDDT 188: 231, 2011). A matéria foi objeto da Súmula 436 do STJ: “A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco”. Esse entendimento foi incorporado à legislação catarinense, no § 1° do art. 62 da Lei 5.983, de 27 de novembro de 1981: “O imposto apurado, e declarado pelo sujeito passivo por determinação da legislação, não pago no prazo nela estabelecido, inclusive a respectiva multa, juros de mora e demais acréscimos legais, poderá ser automaticamente inscrito em dívida ativa, independente de notificação ao devedor”. Considera-se definitivamente constituído o crédito tributário, para os fins de aplicação do art. 174, como marco inicial da contagem do prazo de prescrição do direito da Fazenda exigir o crédito tributário em juízo: (i) no caso de lançamento por homologação, a declaração, pelo contribuinte, do valor do tributo devido e (ii) no caso de lançamento direto, a notificação (ciente) ao contribuinte da atividade da Fazenda que constituiu o crédito tributário. A ocorrência do fato (evento) do mundo real constitui-se em fato jurídico-tributário, no primeiro caso, pelo autolançamento, e no segundo, pelo ato administrativo de lançamento. Porém, havendo impugnação do lançamento pelo contribuinte, considera-se que o lançamento somente estará definitivamente constituído quando não mais couber discussão na esfera administrativa. Então somente da decisão administrativa começará a fluir o prazo de prescrição. Afigura-se incoerente pretender que seja constituído o crédito tributário no momento do vencimento da obrigação tributária, sem que o respectivo fato gerador tenha sido descrito em linguagem jurídica competente, ou seja, sem que o evento tenha sido constituído em fato jurídico. Enquanto a Fazenda Pública não notificar o sujeito passivo do lançamento, intimando-o a recolher o tributo, não pode iniciar o prazo prescricional. Está perfeitamente correto o entendimento do Tribunal de que “a constituição do crédito tributário perfectibiliza-se com a notificação ao sujeito passivo, iniciando, a partir desta, o termo a quo para a contagem do prazo prescricional qüinqüenal para a execução fiscal, nos termos do art. 174 do Código Tributário Nacional”. Contudo, não podemos admitir que “a notificação ao sujeito passivo” se dê na data de vencimento da obrigação. Afinal, o lançamento é um ato administrativo – ou um “procedimento administrativo”, para usar a linguagem do art. 142 do CTN – que se aperfeiçoa com sua cientificação ao sujeito passivo. Não existe “lançamento tácito”, como parece supor a decisão que faz contar o termo a quo da contagem do prazo de prescrição da data de vencimento da obrigação, prevista na legislação. Apenas com o descumprimento do dever legal de adimplir voluntariamente a obrigação na data prevista na legislação é que a Fazenda Pública irá constituir ex officio o crédito tributário, mediante ato formal, intimando o contribuinte a recolher o tributo devido. Mas, como se depreende do voto do relator, a questão não foi analisada pelo Tribunal, por falta de pré-questionamento. Ora, dispõe o art. 174 do CTN que “a ação para cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data da sua constituição definitiva”. O lançamento (constituição do crédito tributário) manifesta a pretensão da Fazenda Pública à cobrança do tributo, condição para que se inaugure o prazo prescricional (princípio da actio nata). Resta saber em que momento se considera definitivamente constituído o crédito tributário: quando o sujeito passivo é cientificado do lançamento ou, como entendeu o digno magistrado, na data de vencimento da obrigação, prevista na legislação tributária? O crédito tributário, diz o art. 139 do CTN, “decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta”. A obrigação principal (art. 113, § 1°), por sua vez, “surge com o fato gerador, tem por objeto o pagamento do tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente como crédito dela decorrente”. A norma tributária contida no texto do direito posto, geral (dirigida a todos) e abstrata (refere-se à previsão hipotética de um fato), associa ao fato gerador (descrito no antecedente endonormativo) uma relação jurídica entre a Fazenda e o contribuinte (obrigação tributária). Porém, para que nasça a obrigação tributária, é preciso que ocorra concretamente o fato gerador. Segundo Dino Jarach (O Fato Imponível: teoria geral do direito tributário substantivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 87), “a obrigação do contribuinte e da pretensão correlativa do fisco se fazem depender da ocorrência de um fato jurídico, o determinado pressuposto legal do tributo, o fato imponível”. Contudo, o simples evento (fato-do-mundo) não é suficiente para que nasça a obrigação tributária: é preciso que se torne fato jurídico para que irradie os efeitos esperados. Na construção doutrinária de Paulo de Barros Carvalho (Direito Tributário, Linguagem e Método, São Paulo: Noeses, 2008), é preciso que o evento seja descrito “em linguagem competente” para que se torne “fato jurídico”. A linguagem jurídica competente constrói uma norma individual (destinada a um só contribuinte) e concreta (refere-se a fato concretamente ocorrido), cujo antecedente contém o reconhecimento da ocorrência do fato gerador e cujo conseqüente constitui o crédito tributário, como direito subjetivo da Fazenda de exigir do contribuinte o pagamento do tributo. À atividade de constituir o crédito tributário, o art. 142 do CTN denomina de “lançamento”. Conforme Eurico Marcos Diniz de Santi (Decadência e Prescrição no Direito Tributário. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 198): “Do mesmo modo que a autoridade administrativa se vê obrigada a efetuar o lançamento tributário, a legislação tributária prescreve ao sujeito passivo o dever de constituir o crédito tributário para efeito de realizar o pagamento antecipado e viabilizar, ao Fisco, o exercício de sua atividade controladora. Não basta, nesta hipótese, que o particular pague, é essencial que se constitua o crédito, identificando-se o sujeito ativo, o sujeito passivo e o fato jurídico que lhe serve de fundamento. Sem esses dados, objetivados documentalmente – mediante os suportes eleitos pelas regras que disciplinam sua formalização (livros de controle, guias de arrecadação etc) – o crédito tributário, juridicamente, não existe. É, pois, por intermédio desse ato do particular que se formaliza em linguagem prescritiva o ‘crédito tributário’ nos chamados ‘lançamentos por homologação’”. Para que o tributo se torne exigível é imprescindível a sua constituição, pelo Fisco, no caso dos tributos sujeitos ao lançamento direto, ou pelo próprio contribuinte, no caso de tributos sujeitos ao autolaçamento (lançamento por homologação). Somente com a constituição definitiva do crédito tributário é que passa a fluir o prazo de prescrição. Não se pode falar em prescrição, sem que o tributo tenha sido previamente constituído. Por outro lado, o contribuinte pode adimplir a sua obrigação, independentemente de lançamento, como mero cumprimento de dever legal. Não se trata de lançamento por homologação ou de autolançamento. Não há um ato de constituição do crédito tributário pelo Fisco (lançamento) ou pelo contribuinte (autolançamento). Haverá, no caso, lançamento de ofício, no caso de inadimplemento da obrigação pelo contribuinte, no prazo regulamentar. 7. Constituição do crédito tributário (IPVA): O fato gerador do imposto, conforme dispõe a Lei estadual 7.543, de 30 de dezembro de 1988, é descrito como “a propriedade, plena ou não, de veículos automotores de qualquer espécie”. Estamos, portanto, diante do que certa doutrina tem descrito como “fato gerador continuado” que é definido por Orozimbo Ribeiro Paiva (Elemento Temporal do Fato Gerador da Obrigação Tributária. São Paulo: Resenha Tributária, 1977, p. 12-13) nos seguintes termos: “será continuado o fato gerador quando a situação definida em lei como tal, após a sua ocorrência, permanece inalterada até o fim do período que, marcado na lei, lhe corresponda”. O art. 2°, § 1°, III, da mesma Lei diz que “considera-se ocorrido o fato gerador no dia 1° de janeiro de cada ano, em relação a veículos adquiridos ou desembaraçados em anos anteriores”. Pode ocorrer que nessa data o antigo contribuinte não detenha mais a propriedade do veículo: (i) por tê-lo vendido, (ii) porque foi furtado, (iii) porque foi sinistrado com perda total etc. Somente haverá o dever de recolher o tributo nas datas previstas na legislação (conforme final de placa) se e somente se for proprietário do veículo. Mas, se ainda for o proprietário do veículo e não tiver recolhido o tributo voluntariamente no prazo regulamentar, a contagem do prazo para a Fazenda Pública constituir o crédito tributário, nos termos do art. 173, I, do CTN, inicia no dia 1° de janeiro do ano subseqüente. Prevalecendo a tese adotada pela sentença, o prazo prescricional (para ajuizar a ação de cobrança do crédito tributário) começa a fluir antes mesmo de iniciar o prazo de decadência (para constituir o crédito tributário). Como é possível falar-se em prescrição de um direito que sequer existe? Diz o art. 4° da Lei 7.543/88 que “o imposto será devido anualmente e recolhido nos prazos fixados em regulamento, sendo facultado ao contribuinte liquidar seu débito a partir da data da ocorrência do fato gerador”. Podemos, então, distinguir a seguinte seqüência na positivação do direito: (i) a legislação determina datas de vencimento da obrigação tributária (IPVA), conforme final da placa do veículo; (ii) o proprietário do veículo (contribuinte) providencia o pagamento do IPVA, utilizando tabela de valores de mercado divulgada pela Fazenda Estadual (considerando que essa tabela integra o conseqüente da norma geral e abstrata) – à evidência, se não for mais proprietário, também não será mais contribuinte e, portanto, estará desobrigado de efetuar qualquer pagamento; (iii) ou, pelo contrário, o proprietário/contribuinte não recolhe voluntária e tempestivamente o IPVA, constituindo-se em mora; (iv) nessa última hipótese, a partir de 1° de janeiro do ano seguinte (CTN, art. 173, I), passa a correr o prazo decadencial para a Fazenda Estadual constituir o crédito tributário; (v) tomando conhecimento da inadimplência, a Fazenda Estadual constitui o crédito tributário (lançamento), na forma do art. 142 do CTN, dando ciência do ato ao contribuinte (notificação fiscal); (vi) com a ciência do lançamento ao contribuinte cessa a fluência do prazo decadencial, pelo exercício do poder-dever de constituir de ofício o crédito tributário; (vii) o contribuinte, caso não se conforme com o ato impositivo, pode impugnar o lançamento, mediante interposição de reclamação junto aos órgãos judicantes administrativos – enquanto durar o contencioso administrativo tributário não corre prazo de decadência, nem de prescrição (conforme mansa e pacífica jurisprudência dos tribunais superiores); (viii) sobrevindo decisão administrativa contrária ao contribuinte, da qual não caiba mais recurso (na esfera administrativa), considera-se definitivamente constituído o crédito tributário, passando, então, a correr o prazo de prescrição. 8. Análise da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: A declaração de extinção do crédito tributário, por ter ocorrido a prescrição da pretensão impositiva da Fazenda Pública, escora-se em jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que considera o “vencimento anual previsto em lei conforme o final da placa do veículo” como termo inicial da contagem do prazo prescricional do IPVA. Examinaremos a pertinência do argumento de dois pontos de vista: o primeiro no que se refere às cautelas que devem ser tomadas nas decisões com base em precedentes, em nome da preservação da segurança jurídica; o segundo diz respeito à justificação das decisões judiciais, da perspectiva da teoria da argumentação jurídica. 8.1. Decisões judiciais com base em precedentes: Assiste-se, neste início de século, a crescente importância dos tribunais superiores, em sua tarefa de uniformizar a jurisprudência. Observa-se mesmo uma aproximação com as práticas da common law, inclusive a utilização de precedentes para fundamentar decisões. Essa nova atitude foi, em grande parte, induzida pela introdução de institutos como a súmula vinculante e a repercussão geral. O cuidado que se deve ter, até em homenagem ao princípio da segurança jurídica, é verificar se o caso julgado guarda a necessária semelhança com o caso tomado como precedente. Trata-se de garantir que casos semelhantes recebam o mesmo tratamento e casos dessemelhantes recebam diverso tratamento. O juiz não deve utilizar o precedente como um “leito de Procusto” em que são ignoradas diferenças fundamentais do caso julgado. A pesquisa das diferenças determinantes revela-se importante técnica no uso de precedentes judiciais. Nesse sentido, Saul Tourinho Leal, em artigo recente (A Técnica do Distinguish em Matéria Tributária. RDDT 192: 132-139), contribui com o seguinte esclarecimento: “Logo, para demonstrar a inadequação da aplicação do precedente ao caso concreto posteriormente apreciado pelas demais instâncias judiciais, o julgador pode se valer da praxe norte-americana de afastar o precedente firmado pela Suprema Corte no caso levado a julgamento, pelo fato de este ser diverso – fática ou juridicamente – daquele. Essa distinção é chamada de distinguish e goza hoje da força digna dos grandes institutos do processo constitucional da common law”. Ora, a leitura da íntegra do acórdão, no julgamento do Recurso Especial 1.069.657 PR, nos revela que naquele caso, no primeiro mês de cada ano “o Estado envia aos contribuintes do IPVA os boletos (notificações/avisos) do lançamento”, circunstância esta não revelada na ementa do acórdão. O envio de boletos aos contribuintes do IPVA, exigindo o pagamento do tributo, caracteriza precisamente a manifestação da pretensão impositiva da Fazenda Pública (notificação de lançamento), a partir da qual, efetivamente, inicia-se a contagem do prazo prescricional (princípio da actio nata). Nesse caso, não há que se falar em fluência de prazo de decadência. Não mereceria reparos, portanto, a decisão da Colenda Primeira Turma do STJ. Com efeito, “a presunção de certeza, liquidez e exigibilidade da CDA é relativa, sendo que esta última pode ser afastada pelo reconhecimento da prescrição. In casu, consoante registrado no acórdão vergastado, a CDA que instrui a execução se refere a débitos de IPVA decorrentes dos exercícios dos anos de 1996 a 2000. Como a demanda foi proposta apenas em maio de 2003, concluiu-se pela prescrição dos tributos incidentes durante os exercícios de 1996 e 1997, por força do transcurso do qüinqüênio legal, ocorrido entre a data da constituição do crédito - que se dá com a notificação do contribuinte para o pagamento do tributo na data de seu vencimento - e a propositura da demanda. É sabido que a prescrição causa a extinção da pretensão pela inércia de seu titular, de modo que, uma vez transcorrido o prazo legal para a busca da realização do direito, este (ainda que esteja estampado em certidão da dívida ativa) passa a carecer de exigibilidade, que é condição da ação executiva”. Mas, não é o caso da legislação catarinense. O Fisco de nosso Estado não envia “boletos” aos contribuintes para que efetuem o recolhimento do IPVA. A iniciativa do pagamento pertence toda aos proprietários de veículos automotores, que, antes de vencido o prazo previsto no regulamento do imposto (conforme final de placa), procuram as agências bancárias, que disponibilizam via sistema informatizado o valor do imposto devido (conforme tabela), efetuando o recolhimento do imposto. Estará, contudo, dispensado do procedimento, se outrem for o proprietário do veículo. Mas se o proprietário de veículo automotor não providenciar o respectivo pagamento, passa a correr, para a Fazenda Pública, nos termos do art. 173, I, do CTN, o prazo decadencial para a constituição do crédito tributário. Nesse caso, o tributo constituído de ofício será acrescido de multa de 50% calculada sobre o valor corrigido do imposto, conforme art. 10, II, da Lei 7.543/88. Mas, é somente a partir da notificação do lançamento definitivo do tributo é que passa a correr o prazo prescricional para o ajuizamento da competente ação de execução; não antes. O que não é admissível é a solução simplista de considerar como termo inicial do prazo prescricional a data prevista para o recolhimento do tributo, sem verificar se o Fisco manifestou a sua pretensão, mediante intimação para pagamento. O precedente somente se aplica se presentes as mesmas circunstâncias. No caso em tela, há uma diferença fundamental (distinguish): os contribuintes não foram notificados a recolher o IPVA, não se caracterizando, portanto, a constituição do crédito tributário. O lançamento é um “procedimento administrativo”, privativo da autoridade fazendária (CTN, art. 142), não podendo ser presumido da previsão regulamentar de datas para o seu pagamento. Não existe, insistimos, “lançamento direto tácito”: é preciso a manifestação da autoridade fazendária exigindo o pagamento do tributo. Conforme prestigiado magistério de José Souto Maior Borges: (Lançamento Tributário, 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 189): “Essa pretensão tributária afirma-se, portanto, mediante a notificação, sem a qual não é possível à Administração exigir o cumprimento da obrigação pelo sujeito passivo. E a conduta do sujeito passivo notificado, obrigado ao pagamento do tributo, corresponde, nesse sentido, ao conteúdo de um direito subjetivo de crédito do Fisco; é o objeto de uma pretensão”. Por sua vez, o Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 1.399.575, da Colenda Segunda Turma, também não enfrenta a questão, apesar da Fazenda ter alegado que "...não tem aplicação o óbice da Súmula 83/STJ, por ser diverso o termo inicial do prazo prescricional na hipótese, considerando a existência do referido processo administrativo fiscal." A decisão segue a jurisprudência assente de que “a constituição do crédito tributário perfectibiliza-se com a notificação ao sujeito passivo, iniciando, a partir desta, o termo a quo para a contagem do prazo prescricional qüinqüenal para a execução fiscal”, como se nesse caso também os contribuintes teriam recebidos boletos exigindo o pagamento do tributo. No entanto, registra o relator que “a tese de que a constituição definitiva do crédito tributário teria ocorrido somente após o término de processo administrativo fiscal não foi analisada na origem, o que impede a sua análise, por falta de prequestionamento, nos termos das Súmulas 282 e 356 do STF”. 8.2. Justificação das decisões judiciais: Preconiza a moderna teoria da argumentação jurídica que não basta às decisões judiciais serem fundamentadas: exige-se que sejam também justificadas. O tradicional silogismo jurídico, em que a premissa maior é a norma contida na lei, a premissa menor, o fato, e a conclusão, a sentença, não garante que a solução dada pelo tribunal seja a melhor decisão possível ou que atenda aos ditames da justiça. Tathiane dos Santos Piscitelli (Quais conseqüências importam na justificação de uma decisão? In: VIII Congresso Nacional de Estudos Tributários: derivação e positivação do direito tributário. São Paulo: Noeses, 2011, p. 1133), citando doutrina de Neil MacCormick, pondera que: “Além da adequação da norma ao caso concreto e, portanto, da dimensão lógica da decisão e da argumentação jurídica, apenas estaremos diante de uma decisão justificada se colocarmos as possíveis soluções para o caso em debate ‘à prova’. E isso é feito por uma justificação de segunda ordem, que envolve o teste de tais soluções em face dos critérios normativos segundo os quais uma decisão é considerada correta – o que significa bem justificada”. A decisão, de acordo com tais critérios, deve ser (i) consistente – não conter contradições em relação ao sistema jurídico, (ii) coerente – realizar os fins e valores do sistema jurídico, e, finalmente (iii) as suas conseqüências jurídicas devem ser aceitáveis. As conseqüências jurídicas da decisão, na perspectiva da doutrina exposta, são consideradas aceitáveis se as razões que dão suporte à decisão puderem ser universalizadas, no sentido de um padrão de conduta “que deve ser observado (do ponto de vista jurídico e não apenas moral) por todos os cidadãos e autoridades, por exigência do princípio de justiça formal” (id. p. 1144). A universalização é aceitável se realizar, ou não contrariar, os valores relevantes ou aceitos naquela específica província do direito. “Assim, se a teoria da argumentação jurídica de MacCormick postula que uma parte essencial e decisiva do processo de justificação das decisões é a avaliação de suas conseqüências, uma decisão bem justificada seria aquela que, além de consistente e coerente com o ordenamento jurídico, é aceitável em suas conseqüências. Dessa forma, deve-se concluir que a conseqüência com a qual essa teoria se preocupa é a conseqüência lógica da decisão ligada ao princípio da universalidade” (id. p. 1145). A decisão judicial sob exame considerou extinto o crédito tributário, por ter sobrevindo a prescrição do direito subjetivo da Fazenda Pública de exigi-lo em juízo, considerando como marco inicial da contagem do prazo prescricional a data de vencimento da prestação. Embora a Fazenda não tenha praticado nenhum ato para formalizar sua pretensão impositiva no caso concreto, a data de vencimento foi considerada como da constituição do crédito tributário. Como pode ser justificada a decisão, segundo os critérios normativos propostos pela teoria de MacCormick? Do ponto de vista da consistência, o marco considerado como inicial da contagem do prazo de prescrição é anterior à própria constituição do crédito tributário, no que contraria a dicção do art. 174 do CTN que manda contar o prazo a partir da constituição definitiva do crédito tributário. O prazo de prescrição também começaria a correr em momento anterior ao do prazo decadencial, nos termos do art. 173, I – primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento (constituição do crédito tributário) poderia ter sido efetuado. A decisão, portanto, encerra uma contradição em relação ao sistema jurídico. Do ponto de vista da coerência, a decisão institui tratamento jurídico diferenciado entre os que satisfizeram pontualmente suas obrigações tributárias – recolhimento do IPVA no prazo regulamentar – e os que descumpriram suas obrigações, favorecidos por uma interpretação errônea do marco inicial para contagem do prazo de prescrição. A decisão, desse modo, vulnera o principio da isonomia tributária, albergado no art. 150, II, da Constituição da República, que proíbe “instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente”. A decisão não realiza a justiça tributária (valor perseguido pelo direito), vista aqui como tratamento isonômico (suum cuique tribuere). Por fim, a decisão inviabiliza a cobrança do IPVA dos contribuintes inadimplentes, frustrando a finalidade primordial do direito tributário que é carrear recursos aos cofres públicos – especificamente ao Estado e aos Municípios. O setor público depende da arrecadação tributária, cobrada de todos segundo a capacidade contributiva de cada um, para realizar suas finalidades essenciais: oferecimento de serviços públicos de qualidade a toda população, consecução do bem comum e garantia do estado de direito. Como bem observa Tathiane Piscitelli (op. cit. p. 1148): “... na identificação dos valores inerentes ao direito tributário, devemos destacar não apenas as questões afetas aos direitos dos contribuintes, mas na mesma medida, aquelas relativas ao direcionamento de receitas aos cofres públicos”. Argumenta a autora que tanto em um como em outro caso, “tem-se a realização do Estado de Direito”, mesmo porque ele somente existe na medida em que existam tributos para financiá-lo. Finaliza a autora dizendo que: “Falar em direito tributário sem o reconhecimento de sua função primordial – qual seja, assegurar receitas para que o Estado possa garantir os direitos dos cidadãos, inclusive aqueles especificamente relacionados com a esfera tributária – é armar-se de uma visão restrita do fenômeno tributário”. As garantias dadas por lei ao contribuinte e as limitações impostas ao poder de tributar não afastam a intenção fundamental do direito tributário que é assegurar as receitas necessárias para financiar o setor público. Assim, se ao cidadão corresponde o dever de contribuir para o financiamento do Estado, assiste-lhe o direito de ser tributado conforme a sua capacidade contributiva e nos estritos limites impostos pela legislação tributária. Com efeito, o IPVA foi instituído por lei, observados o princípio da anualidade e da irretroatividade, bem como as demais limitações constitucionais ao poder de tributar, previstas no art. 150 da Carta da República. Assim, a instituição do imposto respeita as garantias e direitos assegurados pela Constituição ao contribuinte. Resta garantir a razão de ser do tributo que é o financiamento do setor público. Nas palavras do próprio Neil MacCormick (Argumentação Jurídica e Teoria do Direito, São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 192), “as leis têm objetivos racionais voltados para garantir benefícios sociais ou evitar males sociais de um modo compatível com a justiça entre os indivíduos. E a busca desses valores deveria exibir uma coesão racional, na medida em que as conseqüências de uma decisão particular estivessem em consonância com os propósitos atribuídos a princípios afins do direito”. 9. Recomendações: Na parte final de seu voto, o Min. Humberto Martins, relator do AgRg no AgIn 1.399.575, faz o seguinte comentário: “Ademais, a tese de que a constituição definitiva do crédito tributário teria ocorrido somente após o término de processo administrativo fiscal não foi analisada na origem, o que impede a sua análise, por falta de prequestionamento, nos termos das Súmulas 282 e 356 do STF. Se o recorrente entendesse existir alguma eiva no acórdão impugnado, ainda que a questão federal tenha surgido somente no julgamento no Tribunal a quo, deveria ter oposto embargos declaratórios, a fim de que fosse suprida a exigência do prequestionamento e viabilizado o conhecimento do recurso em relação aos referidos dispositivos legais. Caso persistisse tal omissão, imprescindível a alegação de violação do art. 535 do Código de Processo Civil, quando da interposição do recurso especial com fundamento na alínea "a" do inciso III do art. 105 da Constituição Federal, sob pena de incidir no intransponível óbice da ausência de prequestionamento”. Recomendamos, portanto, que seja articulada, junto à Procuradoria Geral do Estado, estratégia para enfrentar futuras discussões em juízo sobre a mesma matéria, com o devido pré-questionamento, para que possa ser, enfim, discutida junto ao Superior Tribunal de Justiça. Ou seja, tratando-se de lançamento ex officio de IPVA, a Fazenda deve levantar, desde o início, a discussão sobre (i) em que momento considera-se definitivamente constituído o crédito tributário, (ii) quando o sujeito passivo é cientificado do lançamento e (iii) qual o marco inicial da contagem do prazo de prescrição. Deve ficar claro que os precedentes invocados do STJ são inaplicáveis ao caso catarinense em que não são remetidos “boletos” ao contribuinte ou qualquer outro ato inequívoco, por parte do Fisco, que possa ser entendido como constituinte do crédito tributário. À consideração superior. Getri, em Florianópolis, 3 de janeiro de 2012. Velocino Pacheco Filho Lintney Nazareno da Veiga AFRE - matr. 184244-7 Gerente de Tributação
ATO DIAT Nº 015/2017 Publicado na PeSEF em 28.07.17 Altera o Ato DIAT nº 006, de 2017, que adota pesquisas e fixa os preços médios ponderados a consumidor final para cálculo do ICMS devido por substituição tributária nas operações com cerveja, chope, refrigerante e bebida hidroeletrolítica e energética. O DIRETOR DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, no uso de sua competência estabelecida no art. 18 do Regimento Interno da Secretaria de Estado da Fazenda, aprovado pelo Decreto nº 2.762, de 19 de novembro de 2009, e considerando o disposto no § 3º do art. 41 da Lei n° 10.297, de 26 de dezembro de 1996, no art. 42 do Anexo 3 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, e a competência delegada pela Portaria SEF nº 182, de 30 de novembro de 2007, R E S O L V E: Art. 1º O Anexo I do Ato DIAT nº 006, de 21 de março de 2017, passa a vigorar, em relação às cervejas e chopes das empresas Besser Bier, Cervejaria Blumenau, Copini Group, Dado Bier, Urutau e Zehn Bier, com os valores de Preço Médio Ponderado a Consumidor Final (PMPF) estabelecidos no Anexo I deste Ato. Art. 2º O Anexo II do Ato DIAT nº 006, de 21 de março de 2017, passa a vigorar, em relação aos refrigerantes das empresas Casa Di Conti e Vonpar/Outros, com os valores de Preço Médio Ponderado a Consumidor Final (PMPF) estabelecidos no Anexo II deste Ato. Art. 3º O Anexo III do Ato DIAT nº 006, de 21 de março de 2017, passa a vigorar, em relação às bebidas hidroeletrolíticas e energéticas da empresa Red Bull, com os valores de Preço Médio Ponderado a Consumidor Final (PMPF) estabelecidos no Anexo III deste Ato. Art. 4º Este Ato entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir do dia 1º de agosto de 2017. Florianópolis, 21 de julho de 2017. ARI JOSÉ PRITSCH Diretor de Administração Tributária
ATO DIAT Nº 016/2017 PeSEF de 27.07.17 Designa representante junto ao Grupo de Trabalho GT-11 da Comissão Técnica Permanente do ICMS - COTEPE/ICMS. Revogado pelo Ato DIAT 45/2022 O DIRETOR DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, no uso de sua competência estabelecida no art. 18 do Regimento Interno da Secretaria de Estado da Fazenda, aprovado pelo Decreto nº 2.762, de 19 de novembro de 2009, RESOLVE: Art. 1º DESIGNAR, FABIANO BRITO QUEIROZ DE OLIVEIRA, matrícula nº 957.696-7, Auditor Fiscal da Receita Estadual – AFRE, como representante do Estado de Santa Catarina junto ao Grupo de Trabalho GT-11 (Sistematização de Legislação do Confaz) da Comissão Técnica Permanente do ICMS – COTEPE/ICMS. Art. 1º - ACRESCIDO – Ato Diat nº 24/2022, art. 1º - efeitos a partir de 03.05.21 Art. 1º-A DESIGNAR LUCAS HENRIQUES COELHO, matrícula nº 617.091-9, Auditor Fiscal da Receita Estadual – AFRE, como representante do Estado de Santa Catarina junto ao Grupo de Trabalho GT-11 (SISTEMATIZAÇÃO DE CONVÊNIOS, AJUSTES E PROTOCOLOS E OUTROS NORMATIVOS) da Comissão Técnica Permanente do ICMS – COTEPE/ICMS. Art. 2º Este Ato entra em vigor na data de sua publicação. Florianópolis, 19 de julho de 2017. ARI JOSÉ PRITSCH Diretor de Administração Tributária
ATO DIAT Nº 018/2017 PeSEF de 25.08.17 Altera o Ato DIAT nº 006, de 2017, que adota pesquisas e fixa os preços médios ponderados a consumidor final para cálculo do ICMS devido por substituição tributária nas operações com cerveja, chope, refrigerante e bebida hidroeletrolítica e energética. O DIRETOR DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, no uso de sua competência estabelecida no art. 18 do Regimento Interno da Secretaria de Estado da Fazenda, aprovado pelo Decreto nº 2.762, de 19 de novembro de 2009, e considerando o disposto no § 3º do art. 41 da Lei n° 10.297, de 26 de dezembro de 1996, no art. 42 do Anexo 3 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, e a competência delegada pela Portaria SEF nº 182, de 30 de novembro de 2007, R E S O L V E: Art. 1º O Anexo I do Ato Diat nº 006, de 21 de março de 2017, passa a vigorar, em relação às cervejas e chopes das empresas Ambev, Cidade Imperial, Colorado, Destroyer Beer, Dom Haus, Germania, Malta e Newage, com os valores de Preço Médio Ponderado a Consumidor Final (PMPF) estabelecidos no Anexo I deste Ato. Art. 2º O Anexo II do Ato Diat nº 006, de 21 de março de 2017, passa a vigorar, em relação às bebidas hidroeletrolíticas e energéticas das empresas Falcon e Termal do Armazém, com os valores de Preço Médio Ponderado a Consumidor Final (PMPF) estabelecidos no Anexo II deste Ato. Art. 3º Este Ato entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir do dia 1º de setembro de 2017. Florianópolis, 21 de agosto de 2017. ARI JOSÉ PRITSCH Diretor de Administração Tributária
Sindicância Investigativa, visando apurar os fatos relativos ao Pregão Eletrônico nº 004/2005.
PORTARIA SEF N° 241/2017 Publicada na PeSEF em 20.07.17 Publica decisão proferida em julgamento de pedido de revisão do índice de participação dos municípios, admitido por força do MS 0302279-75.2017.8.24.0023. O SECRETÁRIO DE ESTADO DA FAZENDA, no uso das atribuições estabelecidas no inciso III do parágrafo único do art. 74 da Constituição do Estado e considerando o disposto nos §§ 7º e 8º do art. 4º da Lei Complementar Federal nº 63, de 11 de janeiro de 1990, o disposto no § 7º do art. 44 da Portaria SEF nº 233, de 2012, e a ordem judicial em Mandado de Segurança nº 0302279-75.2017.8.24.0023. RESOLVE: Art. 1º Publica-se decisão das câmaras reunidas de julgamento de recursos de valor adicionado e índice de participação dos municípios, que em sessão extraordinária, realizada no dia 4 de julho de 2017, apreciaram o Processo SEF nº 163000000000034, pleiteado pelo município de Joinville, decidindo pelo provimento. Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data da sua publicação. Florianópolis, 12 de julho de 2017. ALMIR JOSÉ GORGES Secretário de Estado da Fazenda
Ficam discriminadas no Anexo Único desta Portaria, as receitas desvinculadas de órgão, fundo ou despesa, em atenção ao art. 2º do Decreto nº 1.215, de 2017.
Cria Grupo de Trabalho constituído pelos Diretores da Auditoria Geral, Contabilidade Geral, Tesouro do Estado e Planejamento Orçamentário.
CONSULTA 054/2017 EMENTA: ICMS. DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA. CÁLCULO POR DENTRO. O montante do imposto devido em função da diferença entre a alíquota interna e a interestadual nas operações com destino a consumidor final contribuinte do imposto integra sua própria base de cálculo. Publicada na Pe/SEF em 14.07.17 Da Consulta Narra o consulente que atua na fabricação de fios, cabos e outros condutores elétricos, classificados nas posições 7413, 7605, 7614 e 8544 da Nomenclatura Comum do Mercosul com base no Sistema Harmonizado - NCM/SH, os quais são comercializados com contribuintes do ICMS estabelecidos no Estado de Santa Catarina, que os adquirem para uso ou consumo ou para integração no ativo imobilizado. Informa que tais operações acarretam a cobrança do diferencial de alíquota, cujo recolhimento, em função da sujeição de tais mercadorias à substituição tributária e de protocolo celebrado entre os Estados de Santa Catarina e de Minas Gerais, é de sua responsabilidade. No entendimento do consulente, a legislação do Estado de Santa Catarina é clara no sentido de que o diferencial de alíquota devido nas operações interestaduais com destino a consumidor final contribuinte do imposto deve ser calculado sobre o valor sujeito ao imposto no Estado de origem (cálculo por fora), não se aplicando as regras criadas especificamente para a cobrança do diferencial de alíquotas devido nas operações destinadas a não contribuintes pelo Convênio ICMS 93/2015 (cálculo por dentro). Diante do exposto apresenta o seguinte quesito a esta Comissão: 1) Está correto o entendimento de que a base de cálculo do DIFAL-Contribuinte é o valor da operação de aquisição, assim entendido o valor da operação na unidade federada de origem, não devendo ser o montante devido a título de DIFAL-Contribuinte integrar a própria base de cálculo? O processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme determinado pelas Normas Gerais de Direito Tributário de Santa Catarina, aprovadas pelo Dec. nº 22.586/1984. A autoridade fiscal verificou as condições de admissibilidade. É o relatório, passo à análise. Legislação Constituição Federal, art. 155, §2º, VI, XII, "i". Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, art. 13, I, §1º, I. RICMS/SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, art. 3º, XIV; art. 9º VII, §3º. Convênio ICMS nº 93, de 17 de setembro de 2015, cláusula segunda. Fundamentação A inclusão do imposto em sua própria base imponível, conhecido como cálculo por dentro, tem expressa previsão na Constituição Federal através de seu art. 155, §2º, XII, "i": Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: XII - cabe à lei complementar: i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço. Inicialmente, nota-se que não há discricionariedade no comando constitucional. A lei complementar referida no inciso XII supra citado deve incluir o montante do imposto em sua própria base de cálculo em todos os casos, inclusive na importação de mercadorias e serviços. Com base nesta determinação a Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, determinou em seu art. 13, §1º, I: Art. 13. A base de cálculo do imposto é: § 1º Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo: I - o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle; Para além destas previsões normativas, o próprio Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 212.209-2/RS, declarou a constitucionalidade da forma de cálculo por dentro do imposto em comento. O RICMS catarinense prevê a ocorrência do fato gerador do imposto no momento da entrada, no estabelecimento do contribuinte, de mercadoria oriunda de outro Estado ou do Distrito Federal, destinada a consumo ou ao ativo permanente (art. 3º, XIV), definindo, em seu artigo 9º, a base de cálculo do recolhimento relativo à diferença entre a alíquota interna e a interestadual: Art. 9° A base de cálculo do imposto nas operações com mercadorias é: ... VII - na hipótese do art. 3º, XIV, o valor da operação no Estado de origem ou no Distrito Federal; ... § 3º No caso do inciso VII, o imposto a recolher será o valor resultante da aplicação do percentual equivalente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual, sobre o valor ali previsto. Quando o RICMS determina como base de cálculo do diferencial de alíquota o valor da operação no Estado de origem, por expressa determinação constitucional e normativa complementar - que determinam que a base de cálculo deve compreender o montante do próprio imposto, deve-se entender que o montante do imposto devido em função da diferença entre a alíquota interna e a interestadual está incluído na base de cálculo estipulada. Vale dizer: se a base de cálculo do imposto deve compreender seu próprio montante e se a base de cálculo do diferencial de alíquota é o valor da operação no Estado de origem, logo, o valor da operação no Estado de origem deve compreender o montante do próprio imposto devido a título de diferencial de alíquota. Note-se que quando a legislação tributária utiliza a expressão "valor da operação" não restringe, e nem o poderia fazer, a inclusão do ICMS em sua própria base de cálculo. É o que se depreende do inciso I do artigo 13 da LC 87/96, que define a base de cálculo do imposto nas operações de circulação de mercadoria: Art. 13. A base de cálculo do imposto é: I - na saída de mercadoria prevista nos incisos I, III e IV do art. 12, o valor da operação; Logo em seu §1º, o mesmo artigo afirma que o imposto integra sua base de cálculo. Ou seja, a expressão "valor da operação", ou, mais especificamente, "valor da operação no Estado de origem" pressupõe a inclusão do montante do imposto na determinação da base de cálculo. Se por um lado, como bem afirma Roque Antônio Carrazza (in ICMS, 17ª ed, p. 110), a vedação contida no inciso VI do §2º do art. 155 da CF, que proíbe a existência de alíquotas internas inferiores às alíquotas interestaduais, busca não prejudicar o comércio entre os Estados-membros de modo a desestimular as aquisições interestaduais em função de alíquota interestadual majorada, é certo dizer que a obrigatoriedade de recolhimento do diferencial de alíquota ao Estado de destino tem como função precípua a equalização da carga tributária incidente nas operações e prestações interestaduais e internas, não favorecendo aquelas em detrimento destas, buscando, assim, a neutralidade tributária. Buscando explicitar o que se afirma, tomemos, por exemplo, uma operação de venda de mercadoria que tenha por valor, antes da inclusão do ICMS, o montante de R$ 83,00. Numa operação interna, com alíquota de 17% do imposto, a base de cálculo e o imposto seriam alcançados pela seguinte operação numérica: BC = R$ 83,00/1-0,17 = R$ 100 ICMS = R$ 100 x 17% = R$ 17,00 Operação interestadual, com a mesma mercadoria, e sob a alíquota de 12%, alcançaria os seguintes valores: BC = R$ 83,00/1-0,12 = R$ 94,31 ICMS = R$ 94,31 x 12% = R$ 11,31 Como outrora afirmado, o diferencial de alíquota devido ao Estado de destino tem o condão de equalizar a carga tributária em operações e prestações internas e interestaduais, de modo que o imposto total incidente na operação interestadual deve ser idêntico ao imposto devido na operação interna. O cálculo, portanto, do imposto devido pela diferença entre a aplicação da alíquota interna e interestadual deve ser assim realizado: BC DIFAL = R$ 94,31 - R$ 11,31 = R$ 83,00 BC DIFAL = R$ 83,00/1-0,17 = R$ 100,00 ICMS DIFAL = ICMS Operação Interna - ICMS Operação Interestadual ICMS DIFAL = (R$ 100 x 17%) - R$ 11,31 = R$ 17,00 - R$ 11,31 = R$ 5,69 Nesta hipótese, o adquirente pagou o valor de R$ 94,31 na aquisição interestadual e recolheu ICMS devido por diferença de alíquota no valor de R$ 5,69, de modo que a carga tributária total incidente na operação interestadual foi de R$ 100,00 (R$ 94,31 + R$ 5,69). Ou seja, no idêntico valor da operação interna. Dada a clareza do exemplo vertido, despiciendo demonstrar numericamente que o cálculo do imposto devido por diferença de alíquota sem que ocorra a inclusão de seu montante em sua base de cálculo vilipendiaria a equalização da carga tributária. A Emenda Constitucional nº 87, de 16 de abril de 2015 alterou os incisos VII e VIII do §2º do art. 155 da Constituição Federal, determinando que nas operações interestaduais com destino a consumidor final não contribuinte do imposto, deverá o remetente recolher ao Estado de destino, por responsabilidade, o diferencial entre a alíquota interna do Estado de destino e a alíquota interestadual, modificando, basicamente, a forma de partição do ICMS nas operações interestaduais entre os Estados de origem e de destino. A regra então vigente apresentava duas formas de partição, conforme a qualidade do destinatário da mercadoria. Sendo o destinatário contribuinte do ICMS, o imposto incidente na operação interestadual seria repartido entre os Estados de origem e de destino. Sendo o destinatário da mercadoria não contribuinte do imposto, todo imposto incidente na operação seria devido ao Estado de origem. A EC nº 87/15 determinou repartição do montante do imposto em ambas as situações apresentadas. Ou, de outro giro, o regramento utilizado nas operações interestaduais entre contribuintes é agora aplicável também às operações interestaduais com não contribuintes do imposto. Buscando a uniformização dos procedimentos a serem adotados em função da alteração constitucional retro narrada, os Estados reunidos no âmbito do Conselho Fazendário celebraram o Convênio ICMS de nº 93, de 17 de setembro de 2015, esclarecendo, entre outras coisas, através de sua cláusula segunda, a forma de cálculo do diferencial de alíquota no mesmo molde aqui vertido. Ao contrário do que afirma o consulente, a existência do Convênio ICMS 93/2015 corrobora a obrigatoriedade do cálculo por dentro do diferencial de alíquota nas operações e prestações interestaduais com destino a consumidor final contribuinte do imposto, haja vista que, após a promulgação da Emenda Constitucional 87/15, foi adotada a mesma sistemática relativa ao imposto devido por diferença de alíquota nas operações e prestações cujos destinatários sejam consumidores finais contribuintes ou não do imposto. De modo que se responde negativamente ao quesito suscitado pelo consulente. Resposta Pelo exposto, responda-se ao consulente que o valor do imposto devido em função da diferença entre a alíquota interna e a interestadual nas operações com destino a consumidor final contribuinte do imposto integra sua própria base de cálculo. É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários. PAULO VINICIUS SAMPAIO AFRE III - Matrícula: 9507191 De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 29/06/2017. A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento. Nome Cargo ARI JOSE PRITSCH Presidente COPAT ADENILSON COLPANI Secretário(a) Executivo(a)